Enviado por Fernando Lyra
A promessa de democracia no Ministério da Justiça foi cumprida nogoverno Sarney, durante minha gestão. Exceto, já no final, por causa daquele lamentável episódio de censura ao filme "Je vous salue, Marie."
Fui chamado ao palácio pelo presidente Sarney. Chegando lá, ele estava com o general chefe da Casa Militar e tinha um pedido do bispo de Aparecida, ao qual era muito ligado, para impedir a exibição do filme, que eles imaginavam ser um afronta à Igreja Católica.
Fui contra e disse ao Presidente que jamais censuraria uma obra de arte, que por sinal para mim era medíocre. Mas o presidente reafirmou que era para censurar.
Eu repeti: "Eu não censuro." E o presidente respondeu: "Quem censura sou eu".
Rebati: "Mas, Presidente, quem assina é o Ministro." E saí da sala disposto a renunciar ao Ministério.
Faltavam oito dias para que eu deixasse a pasta.
Chegando ao gabinete convoquei Cristovam Buarque, José Paulo Cavalcanti Filho e Joaquim Falcão, que trabalhavam comigo, para lhes comunicar que iria renunciar porque jamais censuraria o que o Palácio queria.
Eles, menos Joaquim Falcão, argumentaram que eu não poderia renunciar a oito dias da saída. Fiz tudo para convencê-los, mas não consegui.
Durante todo o período que fui Ministro, este é o único fato que me entristece.
Hoje, o fato tende a se repetir e jamais poderia deixar de dar este depoimento.
Uma democracia madura só pode se formar em um ambiente de consciências livres. E essa liberdade ampla não pode conviver com nenhuma forma de censura. Sobretudo nos dias que correm, já distantes dos tristes anos de autoritarismo e do cenário de incertezas que marcaram a transição democrática no Brasil.
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