por Demetrius Caesar,
corresponde do Cineplayers no Canadá.
Há um certo incômodo inicial ao se ver Pina, documentário de Wim Wenders sobre a coreógrafa alemã Pina Bausch, uma das maiores da história da dança. Morta em junho de 2009, sua obra monumental estaria, com sua morte, condenada a desaparecer. É com pesar que se começa a ver o filme: aquela beleza toda prestes a perecer. Mas Pina, o documentário, porém está longe, muito longe de ser um grande funeral da artista. Termina como uma boa parte de suas peças, com humor e nenhum traço de amargura. Alguns dançarinos entrevistados afirmam que, após trabalhar com Pina Bausch por 22 anos, não sabem o que vai ser de suas vidas sem ela; Wenders captura as imagens, todas carregadas de emoção.
Como Pina morreu no auge da carreira, o que vemos na tela é o que há melhor na dança contemporânea do final do século 20 e início do 21. Da primeira fase da carreira da artista, mais sombria, vemos duas obras seminais, Café Müller, de 1978 (que Pedro Almodóvar usou na abertura de seu Fale com Ela [Hable Com Ella, 2002]), e Le Sacre du Printemps, de 1975 (versão de Pina para um clássico A Sagração da Primavera, com música de Igor Stravinsky). Da segunda fase da carreira da coreógrafa, Konthakthof, de 2000, e Vollmond, de 2006. São escolhas acertadas por parte do diretor alemão: não só vemos as duas fases da carreira da artista (e a prova de que a sua arte não envelheceu em absolutamente nada desde os anos 70, quando as peças foram criadas) como duas peças mais tradicionais, "dança pura" (Le Sacre du Printemps e Konthakhof), e duas com estruturas que só têm razão de ser nas peças de Pina Bausch.
( Abaixo o teaser com a participação de Pina, em "Hable Com Ella" )
Wenders filma tudo com requinte e bom gosto, fazendo leves e irônicos comentários das peças, bem ao estilo de Pina, como ao usar atores de verdade nas encenações de Konthakthof, e principalmente ao usar a cidade da companhia, a industrial Wuppertal, ela mesmo uma parte do filme. Explica-se: Pina e seus dançarinos buscavam inspiração no cotidiano, no dia-a-dia das pessoas comuns, gestos inusitados que qualquer um pode ver no metrô indo para o trabalho. Nada mais natural que, num filme, devolver o material ao seu lugar de origem.
Wenders, realmente inspirado nessa sua homenagem a uma artista tão especial, ousou usar a mesma estrutura das peças de Pina para criar seu documentário. Pina não criava as coreografias e depois fazia seus dançarinos repeti-la: ela a tirava deles, usando a bagagem pessoal de cada um deles para criar suas peças. A Wuppertal Tanztheater é seus bailarinos. As coreografias de Pina Bausch são criações de seus bailarinos. Pina as extraía, as montava e lhes dava corpo. O resultado é ao mesmo tempo extrovertido e confessional. Wenders fez a mesma coisa e usou depoimentos dos dançarinos entrecortados de suas atuações. Cada dançarino falou no seu próprio idioma, e sim, ouvimos Regina Advento falar em português, depoimento esse que vai resumir o filme inteiro: uma homenagem densa, porém bem humorada, como a coreógrafa gostaria.
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