Cinema argentino optou pela via comercial, ao contrário do Brasil, que se ligou ao Estado e ainda vive na dependência de ajuda oficial
CARLOS HAAG
Revista da FAPESP - Edição 196 - Junho de 2012
Em Pneumotórax, Manuel Bandeira, após se descobrir doente e lamentar “a vida inteira que podia ter sido e que não foi”, ouve do médico a sentença: “A única coisa a fazer é tocar um tango argentino”. Talvez, hoje, o cinema nacional não chorasse “o que podia ter sido” se tivesse, como os portenhos, nos anos 1930, apostado menos nas benesses do Estado e mais num similar local do “tango argentino”.
“Entre 1933 e 1942, o cinema argentino, com seus musicais populares baseados no tango e no melodrama, viveu la epoca de oro, não apenas subsistindo no seu próprio mercado, enfrentando e se diferenciando da concorrência de Hollywood, como avançou sem a interferência do Estado. A mesma década, no Brasil, como escreveu o crítico Alex Viany, foi simplesmente ‘ingrata’, apesar, ou por causa, do protecionismo estatal”, observa Arthur Autran, professor do Departamento de Artes e Comunicação da Universidade Federal de São Carlos (UFScar) e autor da pesquisa Sonhos industriais: o cinema de estúdio no Brasil e na Argentina (1930-1955).
De início, nos dois países, as oportunidades para a criação de uma indústria cinematográfica eram semelhantes, mas os resultados foram muito diferentes. “O Brasil tinha uma produção numericamente razoável que entrou rapidamente numa decadência que se manteve até o fim da Segunda Guerra Mundial. Já a Argentina teve um aumento paulatino da sua produção e atingiu números expressivos: entre 1930 e 1940, o número de filmes de longa metragem passou de 2 para 56, recorde inigualável, numa indústria que reuniu 4 mil técnicos e atores em 30 estúdios”, diz Autran.
Lá, como aqui, a chegada do cinema sonoro animou os produtores, que apostaram na existência de um público para o filme nacional. Afinal, os talkies americanos, que eram apresentados em inglês, demoraram dois anos para se adaptar ao mercado internacional com legendas e dublagens e atingir um público maior que, até então, não compreendia os filmes por não dominar a língua em que eram feitos. Além disso, a maioria dos exibidores não tinha capital para investir em equipamentos sonoros.
“Era uma oportunidade única e os produtores brasileiros e argentinos, após as décadas do marasmo artesanal do cinema mudo, se movimentaram para criar uma indústria nacional, nos moldes de Hollywood, mas adaptada ao gosto local”, diz o pesquisador. Falava-se mesmo que era “dever pátrio” impedir a “desnacionalização” das culturas nacionais, ameaçadas pelos talkies ianques. No Brasil, a “cruzada” levou à criação da Cinédia, por Adhemar Gonzaga, da Sonofilms, por Alberto Byington, ambas em 1930, e da Brasil Vita Filmes, de Carmen Santos, em 1933. Na Argentina, propiciou a criação da Argentina Sono Film (1931), a Lumiton (1933) e a Rio de La Plata (1934).
Continua Revista da Fapesp ( dica preciosa Aquí me quedo )
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