Com a explosão do caso WikiLeaks, a prisão de seu criador Julian Assange e o protesto que seguidores promoveram invadindo os sites da Visa e MasterCard, do governo e da Justiça da Suécia, ficou inevitável escrever sobre o filme "Os homens que não amavam as mulheres".
Pensei nisso ontem, quando constatei que nas locadoras, pelo menos nas que visito, o número de cópias ainda é pequeno. Não foi preciso, Elio Gaspari foi mais rápido e certamente mais brilhante.
Abaixo, a coluna de hoje, publicada na Folha de São Paulo:
ELIO GASPARI
Lisbeth Salander e os "wikihackers"
Os "wikihackers" mostraram a empresas onipotentes que atrás dos monitores não há apenas fregueses |
À força dos poderosos contrapôs-se a mobilização dos teclados da internet. O mundo do sucesso cibernético produziu figuras legendárias como Steve Jobs e Mark Zuckerberg, mas os "wikihackers" vêm de outro universo, onde há algo de transgressor. Por mais que haja "wikihackers" pensando em virar Jobs ou Zuckerberg, quem eles admiram mesmo é Lisbeth Salander.
Com seis piercings só na cabeça e um dragão tatuado nas costas, ela é a micreira antissocial, introspectiva e malvada dos romances do sueco Stieg Larsson, autor da trilogia "Millenium" (25 milhões de livros vendidos). Salander foi magistralmente interpretada por Noomi Rapace no filme "Os homens que não amavam as mulheres".
Gótica, cerebral e emburrada, come o pão que o diabo amassou, mas seus trocos são dolorosos. Uma das desforras faz do Capitão Nascimento um pacifista. A barreira do seu individualismo só é removida quando liga o computador, com o qual faz o que quer. Ambígua até na sexualidade, Salander não é uma personagem que estimule a clonagem, mas todo hacker tem um pouco de Lisbeth.
A prosperidade dos anos 50 e a fé no poder da tecnologia ajudaram o escritor Ian Fleming a construir a figura de James Bond. O poder que a gregariedade da internet dá hoje ao individualismo criou os "wikihackers" e Lisbeth Salander.
Bond deixou atrás de si alguns tiques, um modelo de pasta e mais nada. O ataque aos portais da Amazon, do Mastercard, da Visa e do PayPal ensinou a essas empresas onipotentes que atrás de cada monitor não está apenas um freguês.
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