terça-feira, 3 de abril de 2012

"Pina", por Arnaldo Jabor

Foto: Thomas Lohnes - AFP
Arnaldo Jabor - O Estado de S.Paulo

Fui ver o filme de Wim Wenders sobre a vida e obra de Pina Bausch e saí do cinema deslumbrado. Estava mesmo precisando de um pouco de beleza, sufocado pela feiura da calamidade urbana de São Paulo e envenenado pela vida política do País, que balança entre vícios ideológicos paralisantes e a corrupção institucional. Com a crise entre governo e aliados, a política virou uma gincana de obstáculos que impedem o Executivo de governar. Além disso, vivemos longe da beleza, intoxicados pelo furacão de irrelevâncias 'pop' que matam a contemplação muda da arte. E Pina é grande arte.

Fui ao cinema em busca de um spa mental. Depois de uns trailers repulsivos de violência para crianças, começou o filme do Wim. Eu andava meio de saco cheio do alemão, desde Asas do Desejo com aquele papo de que os anjos só eram vistos pelas criancinhas. Mas, esse filme é o máximo. Há muito tempo não via algo tão emocionante. Wim parece ter seguido as lições da própria Pina na delicadeza de um teatro dançado. Sua linguagem sem palavras diz mais que conceitos claros.

Jean-Luc Godard disse uma vez que o balé clássico aspira à imobilidade, a uma pose final que atinja um momento 'sublime'. Pina nunca buscou o tal 'sublime', mas só se interessava pela vida concreta (sem realismo, claro), com seus vícios, inibições, medos que impedem encontros definitivos e harmônicos. Seu tema é o desejo humano que resiste, mesmo debaixo do 'mal-estar de nossa civilização'.

Estive com Pina Bausch por alguns minutos, em sua última apresentação em São Paulo. Fiquei tímido e 'tiete' e mal conseguia dizer-lhe algumas frases decentes. Só me ocorriam banalidades sobre seu trabalho, coisas como 'awesome' ou 'cool', equivalentes a 'bem legal' ou 'irado', enquanto ela me olhava, fumando, pálida, pouco antes de sua morte.

Continua O Estado de São Paulo


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